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Restos de um dia

Calor o dia inteiro, sol de rachar mamona, amigos, piscina, cerveja. muito protetor solar nas crianças, talvez não o suficiente. Não parece haver suficiente protetor em um dia assim. Em mim, nada. Esqueci. Agora, as crianças ressacadas se arrumam para dormir. Hoje, uma espera a fada do dente, derruba o leite na mesa e enrola para comer. 

Vou tomar um banho, o corpo dolorido do dia, de ontem, porque hoje foi só sentar, ouvir, falar, beber, comer uma tonelada, enquanto ria do anedotário dos amigos e me preocupava com crianças que querem WhatsApp e com histórias de adultos se passando por crianças para atacar crianças pelo WhatsApp. Agora é o cheiro do dia de sol no corpo, o odor acre de suor velho.  Espero para tomar banho, crianças cheirando a lavanda enrolam para escovar os dentes e dormir, eu finjo não ver e vou tomar banho. As costas ardem acima da gola canoa do vestido leve, que,  mesmo leve, empapou de suor às três da tarde do horário de verão de Brasília. Sol mais baixo, quis vir embora. "Só mais uma! A saideira!" "É raro", pensei,  e fiquei, um pouco mais, só um pouco mais. Dorme agora. Amanhã talvez se arrependa do excesso. 

Crianças enrolam para ir dormir, um estranho silêncio por cinco minutos. Ligaram a TV. "Nada de TV! É hora de dormir."  Prometo que passo para dar um beijo, depois do banho. Enrolo para tomar banho. Uma vozinha cantarola uma canção inventada, um improviso. "Quando paramos de improvisar?" Penso, procuro na linha do tempo, busco alguma memória, mas  não encontro nada. "Quando foi a primeira vez que alguém me disse que não podia? Que não devia?  Que eu não sabia? Quando foi que eu não mais liguei para o que antes me disseram?" Também não sei. Agora discutem, de novo: "se eu pular do quinto andar, você vai pular também?" "Não, eu não sou você!" Até que a resposta é boa. Rio baixinho, mas não me meto. Deve ser o décimo micro debate do dia, encerrei minhas participações. Vou tomar banho.  Já já, vou. 

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  Olhei hoje para o espelho e me vi mais serena, me enxerguei com mais leveza. Não que esteja de fato mais leve, eu acho. Ou será que estou? Tenho ainda infinitas incertezas e dúvidas aos milhares, mas a imagem que me olhou de volta do espelho, não me olha com tristeza, dor pânico.     A imagem que vejo nesse espelho é de     calma, no olhar certa paz, talvez de se entender humana, imperfeita e aceitar essa condição.     Aqui, deste lado que estou, me observando no espelho, sinto ainda o coração encolher como se uma mão o quisesse esmagar. Encolhe-se para sobreviver e expande-se em seguida. Ao encolher-se, a respiração dá uma pausa e uma bolha de cristal sobe em refluxo, pausando ali no meio da goela. Assim que pode, o coração retorna a seu pulsar, seu ir e vir. Permanecem ali as dúvidas, as exigências, as demandas, mas também os desejos de só ser, irresponsavelmente ser e atender a cada quimera. Porque a vida é curta! A vida é sopro!    E o outro? Os outros? Todos os outros?  É precis

Sobre os artistas - Para Bruno Sandes

  Créditos da imagem: Jacobs School of Music Marketing and Publicity